quinta-feira, 20 de março de 2008

Solilóquio

Acabar com as próprias esperanças é tão complexo, quanto pessoas alheias acabarem com esperanças de outrem. Por mais árduo que seja às vezes é imprescindível. Quem sabe por uma proteção natural para evitar póstumos sofrimentos; desistir.
Naquele momento, o chá quente de camomila com um pouco de mel lhe trazia um cínico conforto, de que tudo estava bem. Aquecia sua garganta, sentindo pequenas queimaduras ao descer daquele liquido tranqüilizante. Não tantas, quanto às queimaduras que a feriam por dentro. Seu olhar se comprimia num único ponto imaginário, a busca de uma solução rápida para que talvez ainda existisse algum escasso pretexto para continuar tentando. Não havia. Já havia persistido demais numa causa onde só conseguiria cavar sua própria cova, era a hora de tentar curar seus cancros e poder seguir, no tal plano B desesperado.
Não iria mais cair em joguetes, nos quais estava em jogo seu próprio destino, dessa vez, as coisas já não pareciam mais tão duras. Calejada de outras ocasiões onde àquela história se reproduzia insistentemente. Já não havia mais dores, porém mais intenso que isso latejava o peso denso do fracasso. As estratégias haviam se fundido numa derrota, e a coação de continuar existindo era uma tarefa um tanto sacrificante, mas permanecer com a antiga vitalidade era imperioso. Sabia que aquela perda não era uma avaria qualquer, mas sim um abdicar de uma quimera, caindo das nuvens, pra uma realidade absorvente.
Ela estava ali, presente, sem mais ilusões, sabia que a principal causadora disto era ela mesma por situações passadas onde falsas expectativas haviam lhe feito agir de forma equivoca com seus próprios sentidos.
Num passado distante, já pudera conviver com ensaios de outros numa realidade que era sua própria no tempo presente. Havia desejado poder também ser daquele teor. Parecia impraticável, mas, contudo cobiçava viver daquela forma. Chegou o dia que isto aconteceu, estava como sempre desejava: como aqueles outros viviam e lhe relatavam ser. E não era como esperava que fosse.
A partir daquele momento seria assim. Por mais excêntrico que fosse para uma pessoa que um dia se derretia em amores e ódios turbulentos, viver sem sentir. Anulava seus sentimentos ao extremo. Suas prioridades passaram a ser secundárias, e seus sonhos, começaram a se tornar inúteis, pois o próximo a sua volta não faria o mínimo esforço para tentar vive-los.
A derrota passou a ser vitória num póstumo momento. Pois ela sabia que havia tentado, e arriscou até os últimos segundos, ainda que o grito histérico no seu peito abrisse forças para mudar de chão, num passar dum presságio. E eles, mal haviam se levantado da cadeira para dizer que haviam desistido, permaneciam ali, apáticos e néscios num fato onde se carecia de respostas, por mais duras que fossem. Ela as respondeu, estava exausta, e precisava dormir respirar, e viver sem passar os dias na expectativa de rebate do outro, aquele outro que nem se quer levantou-se pra dizer um não sonoro, para aliviar, e acabar enfim com aquela história, na qual, ela própria tratou de quebrar os laços.
Cortava eles com cuidado e simultaneamente abandonava-os então, como uma mãe desnaturada, deixando um bebê recém nascido numa porta qualquer. Desobrigava-se de uma história onde a única personagem viva era ela própria. Fadigada de monólogos. Entrou cada vez mais num monólogo sem fim, na tentativa de poder fugir deles, os adentrava cada vez mais pujante, cavando um poço pelo qual escoava seu liquido vital entre suas fendas.
Libertar-se, já não era penoso, mas escapar de promessas falidas havia a tornado mais só do que ficar a espera delas serem compridas. O palco escuro, com o divã antigo de arte renascentista a aguardava, para o continuar de um existir, pelo qual o acaso lhe reservava somente, o frio enérgico de um solilóquio. Assim frigidos por fim.

Nenhum comentário:

Postar um comentário